sexta-feira, janeiro 30, 2009

Se partires, não me abraces – a falésia que se encosta uma vez ao ombro do mar quer ser barco para sempre e sonha com viagens na pele salgada das ondas. Quando me abraças, pulsa nas minhas veias a convulsão das marés e uma canção desprende-se da espiral dos búzios; mas o meu sorriso tem o tamanho do medo de te perder, porque o ar que respiras junto de mim é como um vento a corrigir a rota do navio. Se partires, não me abraces – o teu perfume preso à minha roupa é um lento veneno nos dias sem ninguém – longe de ti, o corpo não faz senão enumerar as próprias feridas (como a falésia conta as embarcações perdidas nos gritos do mar); e o rosto espia os espelhos à espera de que a dor desapareça. Se me abraçares, não partas.

- Maria do Rosário Pedreira -

1 comentário:

Dry-Martini disse...

"Tudo no mundo depende de duas vontades: a de querer partir e a de querer ficar. Podes reduzir a guerra, o amor, o dinheiro, a doença e a morte à quantidade de cada um destes dois impulsos. O resto são pormenores"

[Francisco M. Tavares]

Há abraços que simplesmente não partem. Há abraços que simplesmente ficam, para além do momento, para além das vontades, por uma necessidade estranha, funda e tão natural.

XinXin